sexta-feira, 19 de maio de 2017

SOLIDÃO

Solidão é mais do que o sentimento de querer uma companhia ou querer realizar alguma atividade com outra pessoa, não porque estamos isolados, mas por que os nossos sentimentos precisam de algo novo que nos transforme. Muitas pessoas passam por momentos em que se encontram sozinhas, seja por força das circunstâncias ou por escolha própria. Sentir-se sozinho pode ser uma emoção saudável e a opção de ficar só durante um período pode ser enriquecedora e só depende do estado emocional de cada indivíduo. Se este estado de estar sozinho e afastado das outras pessoas implica numa decisão consciente, não há perigo.
É importante oxigenar nossos pensamentos e este arejo passa pelo ato de estar sozinho. A solidão não requer necessariamente a falta de outras pessoas e geralmente é sentida mesmo em lugares densamente ocupados. Pode ocorrer dentro de um casamento ou relacionamentos íntimos similares, quando há ressentimento ou quando o amor dado não é correspondido. Aprender a lidar com mudanças de estilos de vida é essencial para superar a solidão. Viemos ao mundo sozinhos, atravessamos   a vida como seres em separado e, no final, morremos sozinhos.

Eu, particularmente, aprecio a solitude, ainda mais se estiver acompanhada de um bom livro ou um bom vinho.  Como disse Gabriel García Márquez, “o segredo de uma velhice agradável consiste apenas na assinatura de um honroso pacto com a solidão.”.

sexta-feira, 21 de abril de 2017

ATALHOS

Às vezes saio a caminhar. Normalmente no mesmo trecho. Mas tem dias que enjoo do trajeto. Daí mudo a rota. Percorro outro itinerário, que me mostre casas, calçadas, jardins e árvores diferentes. Meu olhar e percepções requisitam novas paisagens e sensações. 
Mudar de percurso me traz breve deleite. Uma sensação de novidade, atualização de consciência; efêmero sentimento de inovação.
Tem dias que pego atalhos. Vou cortando ruas, reduzindo caminhos para acelerar meu destino. Mas quando alcanço o final me arrependo por ter me poupado as pernas e ter reduzido a possibilidade de mais cenários. Sento na grama orvalhada da praça, tiro o tênis e forço meus pés contra a terra – necessidade de me arraigar! Dobro minhas costas e deito para sentir por inteiro a sensação de firmeza e ao mesmo tempo liberdade. Sou terra, chão, sol e ar!
Esta necessidade de me harmonizar com a natureza tem me importunado um bocado. O tumulto urbano, a poluição sonora e visual, o asfalto, as construções... Tudo perdeu a graça. Tenho evitado as mecas de consumo porque não mais me bastam: lugares improfícuos onde os passeios me cansam, os bolsos se esvaziam e o corpo engorda. O verde é meu princípio vital. Faz-me falta olhar a chuva ostentando sua presença sobre as montanhas ao longe, aproximando-se devagar, sem urgências, mas consistente no seu propósito de beijar meu rosto e molhar meus pés. Quero resgatar minha gênese. Preciso me buscar na zona em que me extraviei. Foram tantos anos e planos: amores iniciados, outros mal resolvidos; filhos concebidos e paridos; poemas inacabados, palavras mal pronunciadas, versos não construídos; livros abortados, leituras interrompidas; rascunhos rasgados; noites mal dormidas, remédios ingeridos... Entre outros muitos ‘idos’!

Agora o tempo é breve, vertem líquidos os meus dias. Os prazos de validade vão-se vencendo e se eu não aligeirar meus passos, me atrapalho e perco as horas. Todas as demandas pedem urgência. Dobro os joelhos, subo meu corpo. Calço o tênis e me coloco em pé num único impulso. Caminhar é preciso, mas não há mais intervalos para abstrações. Hoje escapo de passagens tortuosas, evito impasses, encurto distâncias, sigo atalhos.

sexta-feira, 24 de março de 2017

E POR FALAR EM SAUDADE

A palavra saudade é oriunda do latim "solitas, solitatis"  - solidão. É uma das palavras mais utilizadas nas poesias de amor, nas músicas românticas da língua portuguesa. Ela não tem tradução literal em muitas línguas. Significa o sentimento melancólico devido ao afastamento de uma pessoa, uma coisa ou um lugar, ou à ausência de experiências prazerosas. Segundo a lenda, a saudade surgiu no período dos descobrimentos e definia a solidão que os portugueses vindos para o Brasil tinham da sua terra e dos seus familiares. Eram atacados por uma melancolia por se sentirem tão sós e distantes dos seus.
A saudade é uma incongruência: ao mesmo tempo em que aperta o nosso coração, preenche ele de amor. Ao sentir saudade revivemos sensações e sentimentos. Por meio dela, nos conectamos com todo um passado já vivido e também um futuro que ficou por viver.
No início, a saudade vem acompanhada de muita dor. Ela de fato tiraniza o nosso coração, penaliza a alma. Como disse nosso ‘poeta das coisas simples’: Eu agora – que desfecho! Já nem penso mais em ti... Mas será que nunca deixo de lembrar que te esqueci!
Eu já engoli muitas saudades. Bebi desta aguardente mais do que queria e devia, mas não menos que o necessário para aprender a lidar com a danada. Hoje até olho para ela com um pouco de gratidão.  Fui compreendendo que ela é o vínculo com quem não está mais perto de mim fisicamente e experimentá-la é gozar todo amor que ficou e que nunca irá me separar desse objeto.  
E pra terminar, ‘saudade é nossa alma querendo dizer para onde ela quer voltar’.