sexta-feira, 24 de agosto de 2018




CHOVE LÁ FORA

O inverno continua insistindo na sua presença fria, inexorável, pertinaz. Da minha vidraça observo as calçadas molhadas, poças na rua, o chuvisqueiro cortando o ar. A amoreira, com os poucos dias de sol e temperatura um pouco mais alta da semana passada, se encheu de brotos, folhas e pequenas frutinhas. Apressada, roga pela primavera. Eu, assim como a amoreira, me sinto pronta para rebentar minha natureza, reprimida pelas circunstâncias da vida. Tantos planos por germinar, expectativas malogradas, saudades contidas, rascunhos desperdiçados, versos não construídos. Quero gritar ou correr, não consigo. A chuva atrapalha as corridas, os gritos perdem-se na solidão da casa. E tudo fica no zero a zero, mas eu quero um a um. As vontades e lembranças são de amor e calor, mas a realidade me remete ao frio aqui do sul.
Bem dizem os especialistas e as pesquisas, que o clima pode alterar funcionalmente os estados emocionais humanos. Há uma estreita relação entre o humor e o tempo, sem dúvida. O verão é de humor elevado, o inverno reflete a introspecção. Deve ser porque a luz do sol estimula a produção de serotonina, dopamina e melatonina. É a química do cérebro ditando as regras do nosso bem estar. Mas não é só isso, além das reações químicas positivas que a presença do sol traz para o organismo, também existem benefícios psicológicos. Nos meses e estações onde os dias são mais quentes, iluminados e longos, existe algo no ar que nos convida a sair e interagir. No entanto, em dias em que o tempo está fechado e as temperaturas mais baixas, acontece o contrário, o convite para hibernar e refletir. É uma oportunidade de reciclagem interna. É o que estou tentando fazer nesses últimos dias de chuva, frio e quarentena: remastigando emoções, cogitando possibilidades, requalificando dados. Preparando-me para ‘soltar esta louca e arder de paixão’.