sexta-feira, 15 de novembro de 2019


VÉSPERA DE FERIADO

A tarde está acabando e o movimento no trânsito aumenta na mesma medida que os escritórios, lojas e casas se esvaziam. Saí do trabalho mais cedo, como noventa e nove por cento das pessoas, agitadas pela ânsia do feriadão. Todos correm com seus automóveis para pegar a estrada rumo ao litoral, interior, ou a lugar algum. Esta cinesia me causa efeito contrário. Chego em casa, dou ração para o meu gato, coloco tênis e roupa adequada para correr.
Caiu uma boa pancada de chuva e depois o sol arrematou o dia com suas nuanças alaranjadas. Os pássaros chegam em revoada para aproveitar as árvores desocupadas. As flores cheias de preguiça, caem do alto das copas, formando um tapete colorido na relva úmida. As formigas também folgaram, exceto algumas obstinadas pelo trabalho, solitárias, com suas cargas pesadas e supérfluas, caminhando atrapalhadas rumo às suas furnas.
O arvoredo agradece aos céus pela água derramada. Silenciosas, as árvores com seus troncos antigos e galhos longilíneos, gozam o mormaço de fim de tarde com o mesmo sossego dos espíritos brandos.
Com a cidade vazia, a natureza se excede. É prazeroso contemplar esses momentos que poucos veem.
Eu sigo no meu trote, observando tudo e pensando em nada, suando minhas angústias, exalando réstias de felicidade. Sigo sempre, em frente, enquanto o ar morno me tapeia as faces..., mas não tenho certeza se depois do feriado serei feliz de novo.

quarta-feira, 6 de novembro de 2019


SINTONIA

No meu bairro tem muitas árvores frondosas, especialmente na praça, que não é apenas uma pracinha com brinquedos para crianças. É bem mais! Tem uma pista de caminhada ou corrida de duzentos metros, muito gramado e árvores antigas de várias espécies, como o ipê roxo e o amarelo. Diariamente é neste local que faço caminhadas e meditações. Assim como eu, várias pessoas por ali circulam, caminhando, correndo, levando seus pets para passear, ou simplesmente sentados num banco tomando chimarrão ou sol, lendo, conversando.
Também há várias espécies de pássaros: bandos de caturritas, sabiás, bem-te-vis, rolinhas, que seguidamente voam dos galhos para comer minhoquinhas e outras guloseimas que se encontram entre as gramas.  São mansinhos e nem se importam com as pessoas e cães que ali transitam. Minhas caminhadas são o impulso que necessito para enfrentar os dias e suas contingências. É através do suor que alivio minhas inquietações.
É um alento ouvir os pássaros gorjeando, as árvores balançando e também as formigas, sim, as formigas, sempre na labuta. Cuido para não pisar nelas quando estão em trilhas, carregadas de folhas e gravetos, atravessando a pista.
Será que todos que ali circulam percebem essas delícias que a natureza nos proporciona? Acredito que sim, que todas as pessoas se sentem gratificadas com a exuberância e simplicidade que esse espaço nos proporciona. E num ataque de felicidade qualquer, abraço uma árvore, sinto seu cheiro peculiar, sua espessura nas minhas bochechas, sem me importar de alguém me achar desvairada. São meus devaneios simbólicos, minha expressão de sintonia e correspondência com o universo.

sexta-feira, 25 de outubro de 2019


AMIGAS

Os velhos clichês ‘amigos de verdade a gente conta nos dedos’ ou, ‘quem tem um amigo nunca está só’, são realmente insuspeitos. Nós, mulheres, sempre temos aquela amiga única, autêntica e verdadeira. A amiga com quem compartilhamos nossas mais próprias intimidades. É ela que nos recebe no meio da tarde, num encontrinho rápido, mas com tempo suficiente para ouvir desabafos recíprocos, trocar risos e lágrimas, entre um e outro cafezinho. Ela é especial para nós, é mais que cúmplice, é terapeuta, conselheira, curandeira...
Quando se trata de falar da família e dos filhos, é com ela que barganhamos queixas e distribuímos elogios, assim como se fala da cor do cabelo; da unha que não deu tempo de fazer; da última base com filtro solar que além de boa textura, está no mercado com preço popular, das dores e das rugas. Conversamos também sobre os quilinhos a mais e das múltiplas e fundamentais manobras para se equilibrar na balança. Trocamos receitinhas de comida fitness, e ao mesmo tempo dividimos um chocolate meio amargo junto com o café, afinal ninguém é de ferro, além do mais chocolate é bom para o coração!
E o melhor de tudo, é que esta amiga fiel e autêntica chega na nossa vida de modo extemporâneo. Ela pode surgir no trabalho, num encontro de mães ou numa festa do colégio dos filhos, num jantar de negócios, nas redes sociais, na academia...
Se você precisa fazer aquele exame médico ou cirurgia que exige um acompanhante, e não tem nenhum familiar disponível, pode acreditar, a amiga não irá falhar. Estará na escolta desde a chegada até a saída.
O relacionamento entre amigas é sentimento profundo de lealdade, reciprocidade e proteção. São aqueles anjos que nos deixam em pé quando nossas asas têm problemas em se lembrar do voar. Tornam nossas vidas mais brilhantes e felizes.  E quando estivermos bem velhinhas, sem mais nenhuma ‘utilidade’, a verdadeira e única amiga estará lá, até o fim.