MEU BAIRRO
No bairro onde
moro, crescem gramas entre as calçadas. Já vi até bem-me-quer. As ruas são meio
tortas, desniveladas. Mesmo assim, alguns dias atrás a Prefeitura asfaltou a
rua principal, que é a minha. Ficou bom, mas os carros agora correm mais. E
isso não é bom para as crianças e jovens que gostam de brincar, conversar ou
tomar cerveja na beira das calçadas.
Tem a Igreja, e
todos os domingos de manhã e terças de tarde, reza-se missas. O pátio da Igreja
é amplo, com um bonito jardim e uma escada que vai da rua até a porta do
templo. Em junho de todos os anos, que é o mês do santo da igreja, acontece a
festa com procissão. Milhares de pessoas
circulam agitadas pelos arredores. A minha rua, que é a mesma da igreja, é
bloqueada para os automóveis e é onde a procissão passa, pela manhã e à
noitinha. Os devotos e pagadores de promessas vão cantando com velas nas mãos,
sobre as cabeças. A rua até parece um grande manto iluminado, movendo-se
lentamente. E as moças solteiras fazem encomendas de graças, e pagam outras
alcançadas, acendendo velas de sete dias, ou velas de mais de um metro, no
velário.
Na praça, as
crianças ainda andam de balanço e gira-gira, enquanto os pais tomam chimarrão e
sol nos bancos. Numa esquina tem uma agência de beira de estrada. Ali se faz
panfletos, toldos, cartões, faixas e outro escambau. E também muita lambança.
Salão de beleza tem uns cinco. Uma farmácia e um açougue, três supermercados e
uma padaria, que é uma tentação. Finalzinho da tarde, quem passa para, porque o
cheirinho do pão fresco convida para um café. E quando alguém entra não é só um
pão que leva. Pega bolo, croissants, pasteizinhos de queijo, tortilhas de
limão...
Duas linhas de
ônibus e uma lotação fazem o transporte coletivo. Às vezes cheios, às vezes
vazios, depende do horário. Início da manhã e final de tarde, sempre lotado.
Minha vizinha da frente só anda de lotação. Deve ganhar bem, porque a passagem
é cinco e vinte e cinco, subiu. Tem também muitos gatos e cachorros, que latem
por qualquer coisa: quando outro cão se aproxima, quando um gato atravessa a
rua, ou quando o carteiro passa. Em noite de lua cheia, os gatos namoram
nos telhados, soltando gritos esganiçados de fúria e prazer. É uma orgia.
Se eu tivesse
podido escolher, com certeza não escolheria esse bairro para morar. Mas cheguei
aqui por circunstâncias alheias. E como nem todos moram onde querem, eu também
moro onde eu posso. E é aqui que eu posso morar. Sei que não saio daqui tão
cedo, por isso aprendi a gostar deste lugar. Comecei apreciar as coisinhas
miúdas que me acontecem. Banalidades, acasos, coincidências. Este bairro é o
meu presente, que curto e compartilho.
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