domingo, 22 de julho de 2012


OLHAR ACUSADOR

Nunca gostei muito de espelhos. Gosto de me apreciar, mas sem narcisismos. Como diz Caetano, “todo Narciso acha feio o que não é espelho”.
Dia desses entrei num magazine, com departamentos e  roupas de todo gênero. Empolgada, enchi uma sacola de peças variadas e me enfiei num provador. Tinha espelho nos três lados e no teto, luzes fortes e claras. Via-me por todos os ângulos e naquele espaço de um metro quadrado de espelhos não há mínimo detalhe das tuas carnes que passe ileso. Tirei o que vestia e comecei aquela maratona de experimentações. Tudo ‘caia muito mal’! O que estava errado? Parecia gorda, barriga com ‘pneus’, a cintura sumida entre gorduras localizadas, culotes salientes, bunda flácida, seios enormes, canelas finas, cabelo seco e sem vida, com fios brancos na raiz, o nariz caído, pés de galinhas? Também, muitos pés com pernas e tudo. Vi-me literalmente nua, exposta em toda vulnerabilidade da minha matéria. Nenhum ângulo me dava qualquer esperança. Estava velha, gorda e feia! Os ‘olhos do espelho’ acusavam a verdade dos fatos. Prova cabal. Sentença irrecorrível. Julgada e condenada pelos caprichos do tempo.
Sai do provador arrastando a sacola de roupas junto com minha auto-estima. Chegando à casa fui tirar satisfações com meu espelho.
_ Ingrato, porque me enganou tantos anos? Por que teus olhos não acusam a realidade das minhas formas?
Serenamente, me acalmou:
_ Querida, não sou eu o ingrato. Os espelhos que te viram, também mostram as milésimas cicatrizes de plásticas, peitos e pernas turbinados, rostos esticados, cabelos tingidos, narizes empinados.
Serenamente, me acalmei. Meu espelho é bem mais sincero, honesto, leal. Beijei-me nele e me gostei muito.
Afinal, cada mulher se espelha do jeito que quer.


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