domingo, 17 de junho de 2012


O BAILINHO DE DOMINGO


Chega-se lá pelas quatro da tarde. A pista já está cheia, as mesas também. Um cheiro de naftalina no ar, misturado com perfumes de aromas diversos e indescritíveis, um odor de alegria misturado com nostalgia; de juventude com velharia; de realidade com fantasia.
Numa mesa mais ao fundo, próxima da pista e do banheiro feminino, local estratégico, senta o Piu-Piu. Com oitenta e oito anos, restam-lhe ainda alguns fios muito finos e branquinhos de cabelos, que ele penteia para trás com alguma coisa umedecida para que se mantenham firmes na posição. Suas juntas estão doentes de artrose. Mesmo assim, dança com os braços e as mãos, acompanhando a música do conjunto. De vez em quando uma moça vem e lhe tira para ‘uma peça’. Ungido de todas as forças, mais da alma que do corpo ele sai rodopiando, marcando direitinho o ritmo, seja lá qual for, e aguenta firme até o final.  Depois senta e toma mais um gole do uísque bom que trás de casa, numa garrafa muito particular. O garçom que já o conhece, deixa-lhe uma jarra com pedrinhas de gelo e alguns guardanapos, em troca de uma polpuda gorjeta de doze reais.
As mulheres usam seus melhores modelos de vestidos, blusas, calças justas ou saias de oncinha, pretas ou coloridas, com bijuterias e encharpes muito brilhosas. Gordas, magras, velhas, seminovas, retocadas, plastificadas... Não importa, a regra é ser feliz! 
Os homens, mais raros, são quase sempre os mesmos: o carioca, a cada domingo, usa um terninho de cor diferente, conforme o tema da ocasião: durante a copa do mundo, usa um terno com as cores da bandeira do Brasil; no domingo que tem GRENAL, vem de vermelho, deve ser colorado e nos ‘domingos normais’, usa os outros, branco, bege, azul... Sempre combinando com sapatos envernizados e gravata. Ele dança sempre no mesmo passinho, independente do ritmo. Deve ser por causa dos muitos anos de marcha no exército. È sargento aposentado!
Tem um senhor que chega com uma boina e um termo escuros e camisa vermelha. A gravata sempre é branca. Entra com as mãos no bolso, olhando por cima, de cá para lá, sondando o ambiente, com ares de predador. Quando começa a dançar, não para mais. Reveza com a mulherada que parece se divertir muito com ele salão afora.
Lá pelas tantas, a música cessa e a dona do baile, com voz aguda e meio fanha, sobe no palco com seu rei e rainha. Agradecem as presenças, anunciam os aniversariantes, convidam para o próximo. Os presentes formam um grande círculo na pista, o conjunto começa a tocar ‘feliz aniversário’ e os parabenizados giram pelo salão mostrando seus passos e movimentos, cada qual se proseando mais do seu desempenho.
O círculo se desfaz, uns voltam a sentar, outros trocam de pares e continuam a dançar. Algumas mulheres vão ao banheiro retocar cabelo e maquiagem. Retornam às mesas sentindo-se renovadas e...  Segue o baile.




2 comentários:

  1. Denair,
    Que continues escrevendo.
    Que bom ver a tua produção literária.
    Não só faz bem para ti como faz para todos nós.
    Adeli

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  2. Olá Dena. Tudo bem contigo? Adorei esta crônica. Ainda não tive tempo de ir num bailinho de domingo. Qualquer dia vou e te conto. Beijos.

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